Sobre as Microexpressões Faciais

Antes de definir e explicar o que são as microexpressões faciais, é importante dizer que para se ler e entender adequadamente uma face e uma expressão facial, é necessário utilizar procedimentos científicos de análise. Para isto, existe o Facial Action Coding System (FACS), que foi criado por Paul Ekman e Wallace Friesen, nos anos 70 (e revisado em 2002 com a participação de Joseph Hager), e o Emotion FACS (EMFACS), que converte as pontuações do FACS em estados emocionais, com base nas emoções básicas universais.

FACS e EMFACS

o FACS é a ferramenta científica de mensuração das ações faciais em seres humanos, cuja pontuação é marcada em números que dizem respeito às Action Units (AUs) do código FACS. O EMFACS é o suporte utilizado para interpretar essa pontuação, com base em AUs e intensidades específicas, para relacionar à estados emocionais correspondentes.

7 emoções básicas

Figura 1 – Macro Expressões Faciais da Emoção representadas em modelo humana. Retirado de: Ferreira, C. (2017/2018). As Faces das Emoções Básicas (FEB). São Paulo: CICEM.

O FACS e o EMFACS são o resultado de anos de pesquisas científicas em várias culturas, estudando os movimentos da face humana, produzindo uma ferramenta de mensuração e investigando, até chegar-se à evidências suficientes para concluir sobre o caráter universal de 7 emoções básicas (alegria, raiva, medo, tristeza, aversão, desprezo e surpresa).

Emoções essas, que ao vivenciadas por indivíduos de qualquer sociedade ou cultura do planeta, irão acionar os mesmos músculos faciais e ainda que se tente controlar a expressão facial da emoção, buscando mascarar ou neutralizá-la, a chamada microexpressão, irá revelar o verdadeiro conteúdo e carga emocional do discurso.

Afinal, o que são as Microexpressões Faciais

Então, o que são?

Figura 2 – Caio Ferreira em curso do CICEM explicando sobre a neuropsicofisiologia das emoções. Foto: LS.

As microexpressões faciais são um tipo de expressão facial, caracterizada por ser involuntária, de baixa intensidade (no que diz respeito ao movimento de contração muscular), muito rápida e estar associada ao vazamento uma emoção que se tenta dissimular. Não foram descobertas por Ekman (como muitos acabam pensando), mas por Haggard e Isaac, que publicaram em 1966 o artigo científico micro-momentary facial expressions as indicators of ego mechanisms in psychotherapy, onde apresentaram, pela primeira um estudo de investigação que relatou a ocorrencia das microexpressões em seres humanos, no contexto da psicoterapia, pela relação entre paciente (ou cliente) e psicoterapeuta. Neste estudo, o que hoje conhecemos como microexpressões foi apresentado enquanto expressões micro-momentâneas (em tradução livre).

Durante essas explorações, por exemplo, notamos que ocasionalmente a expressão no rosto do paciente mudava dramaticamente dentro de três a cinco quadros de filme (de sorriso, para careta, para sorriso), o que equivale a um período de 1/8 a 1/5 segundo.

(Haggar & Isaacs, 1966, p. 154, tradução livre)

Este fenômeno facial, quando manifestado por uma pessoa, torna-se um objeto valioso para a análise e compreensão do real estado emocional desta. Por exemplo, um indivíduo, ao ganhar um presente ou receber uma proposta e esta não o agradar, pode até reagir exibindo um sorriso, mas ao tentar mascarar a emoção que, de fato está sentindo, a microexpressão de aversão (ou de raiva, ou de tristeza…) vai vazar em sua face e a verdade sobre aquilo que sente no momento será revelada, sobretudo, o indivíduo não exibirá um sorriso verdadeiro se não estiver alegre frente ao presente que ganhou. E para a correta identificação deste, há os marcadores faciais e as Unidades de Ação (AUs), que o FACS permite analisar e medir de forma segura.

Micro Expressões vs Macro Expressões Faciais

As micro e as macro expressões faciais são os dois princiapais tipos de expressões emocionais que costumamos estudar. O reconhecimento das macro expressões não precisa de muito estudo, sendo que a maioria das pessoas sem treinamento consegue identificar corretamente a maioria delas. Em contrapartida, muitas pessoas nem sabem da existência das micro expressões e, ainda que saibam, não conseguem identificar ou reconhecer.

As macro expressões são duradouras, intensas, costumam reforçar aquilo que é dito verbalmente para a pessoa e não são confiáveis para inferir sobre os estados internos de alguém, já as micro expressões, têm duração entre 1/2 e 1/25 de segundo, baxíssima intensidade de movimento múscular e, por serem involuntárias, são confiáveis para inferir sobre os estados internos de algúem. Vale dizer também que elas costumam acontecer quando alguém não quer mostrar aquilo que esta sentindo, seja de forma consciente (supressão) ou de forma inconsciente (repressão).

Implicações das Microexpressões

Pelo fato de as microexpressões estarem relacionadas à uma emoção que se processa à nível cerebral, mas que se manifesta, de forma involuntária, na face humana, uma de suas principais implicações dizem respeito à detecção da mentira (por meio da detecção da verdade), ao passo em que é possível, com sua análise científica, perceber as incongruências emocionais, isto é, quando se exibe algo que não se está sentindo em um determinado momento; uma mentira; uma incongruência/divergência entre a linguagem corporal (e a comunicação não-verbal) para com a comunicação verbal.

O seriado de televisão Lie To Me faz referência às implicações e aplicações do FACS e da identificação e reconhecimento das microexpressões, ao passo em que apresenta o protagonista Carl Lightman (inspirado em Paul Ekman), como consultor do FBI e CIA para auxiliar na investigação de crimes e ameaças. Isto é, quando este personagem detecta, pela face, aquilo que o outro está, de fato, sentindo, ele está utilizando os códigos e marcadores do FACS para analisar e interpretar as expressões e microexpressões faciais da emoção.

Lie to Me - microexpressões faciais

Figura 3 – Fox

Também é importante frisar as implicações clínicas que a análise e o reconhecimento das micro expressões faciais nos permitem, uma vez que sua própria descoberta ocorreu durante sessões de psicoterapia. Hoje já é possível utilizar as expressões faciais tanto do paciente, quanto do terapeuta, para intervir em situações clínicas, e a análise da linguagem corporal tem se mostrado uma excelente ferramenta auxiliar para, por exemplo, avaliar e diferenciar tipos de depressão (com e sem ideação suicida).

Por fim, vale dizer que o FACS já é usado há mais de 40 anos, no sistema de justiça e segurança dos Estados Unidos da América (EUA), pelo FBI e CIA, e na Inglaterra, pela Scotland Yard, por exemplo.

A título de exemplo, vale dizer que, quando o personagem Carl Lightman, do seriado Lie To Me, identifica uma microexpressão ou emoção na face de alguém, trata-se de uma referência direta à uma das aplicações possíveis com o uso do FACS. Seriado este, inspirado na vida de Paul Ekman e que contribuiu, recentemente, para uma maior divulgação desta temática.

Como estudar/aprender as Microexpressões Faciais

A melhor e mais adequada forma que julgamos para a aprendizagem da identificação e reconhecimento das microexpressões faciais é por meio do estudo do Facial Action Coding System (FACS), uma vez que o FACS é a ferramenta mais completa e segura da atualidade na hora de se analisar um comportamento facial. Nos nossos cursos sobre expressões faciais, emoções e análise da veracidade, sempre abordamos a temática do FACS e das micro expressões. Consulte aqui os próximos cursos com inscrições abertas e faça já sua inscrição.

Os vídeos abaixo mostram uma microexpressão facial de alegria, representada pela ação da Action Unit 12 do FACS correspondente à contração do músculo Zygomaticus Major em modelo humano. O primeiro vídeo faz parte do modo de ensino e o segundo vídeo faz parte do modo especialista, que está em edição no CICEM e integrará as plataformas online de aprendizagem e prática.

Também desenvolvemos (2020), uma nova base de dados para estudo das micro expressões faciais. A base de dados é composta por 14 pranchas para estudo e 41 imagens para treino.

micro expressão facial de medo

(Exemplo de micro expressão facial de medo. Ferreira, C. (2020). Base de Dados CICEM: Micro Expressões em Faces Humanas-2.0 (CICEM:MEFH-2.0). São Paulo: CICEM.)

micro expressão facial de desprezo

(Exemplo de micro expressão facial de desprezo. Ferreira, C. (2020). Base de Dados CICEM: Micro Expressões em Faces Humanas-2.0 (CICEM:MEFH-2.0). São Paulo: CICEM.)

Micro expressão de tristeza

(Exemplo de micro expressão facial de tristeza. Ferreira, C. (2020). Base de Dados CICEM: Micro Expressões em Faces Humanas-2.0 (CICEM:MEFH-2.0). São Paulo: CICEM.)

Os materiais autorais e exclusivos do CICEM são partilhados com os alunos de nossos cursos. Alguns podem ser adquiridos separadamente, consulte no e-mail: contato@cicem.com.br

Referências e Recomendações

Ekman, P. (2003). A linguagem das emoções: revolucionando sua comunicação e seus relacionamentos reconhecendo todas as expressões das pessoas ao redor. São Paulo: Lua de Papel.

Ekman, P. & Rosenberg, E. L. (Eds.). (2005). What the face reveals: basic and applied studies of spontaneous expression using the facial action coding system (FACS) (2nd ed.) New York: Oxford University Press.

Ekman, P.; Friesen, W. V.; & Hager, J. C. (2002). The Facial Action Coding System. (2nd ed.) Salt Lake City, UT: research Nexus ebook.

Ferreira, C. (2017). Base de dados CICEM: Microexpressões em Faces Humanas (CICEM:MEFH). São Paulo: CICEM.

Ferreira, C. (2017/2018). As Faces das Emoções Básicas (FEB). São Paulo: CICEM.

Ferreira, C. (2018). Estudos sobre a mensuração científica da face humana: vol. 1 – o guia do emocionauta. São Paulo: CICEM Ed.

Ferreira, C. (2020). Base de Dados CICEM: Micro Expressões em Faces Humanas-2.0 (CICEM:MEFH-2.0). São Paulo: CICEM.)

Ferreira, C. & Freitas-Magalhães, A. (2017). Facial Action Coding System 2.0: Guia F-M FACS 2.0 EDU 2017. São Paulo, Brasil: F-MGB Lab.

Grazer, B. (Producer). (2009-2011). Lie to me. [Television Series]. California: 20th Century Fox Television.

Haggard, E. A., & Isaacs, K. S. (1966). Micro-momentary facial expressions as indicators of ego mechanisms in psychotherapy. in l. A. Gottschalk & A. H. Auerbach (eds.), Methods of research in psychotherapy (pp. 154-165). New York: Appleton-Century-Crofts.

Para saber mais

Por um mundo mais emocional!

comunicação não-verbal linguagem corporal

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